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sábado, 31 de dezembro de 2011

Sancionado decreto que eleva salário mínimo para R$ 622,00


Publicado hoje no DOU, o decreto 7.655 define o valor de R$ 622 para o salário mínimo a partir de 1º de janeiro de 2012. O novo valor representa um aumento de 14,13% em relação ao atual, de R$ 545. Com o reajuste, o valor diário do salário mínimo corresponderá a R$ 20,73 e o valor pago pela hora de trabalho será de R$ 2,83.
O método de reajuste do salário mínimo foi definido por meio de uma medida provisória aprovada pelo Congresso. A lei que fixa a política de reajuste do salário mínimo estabelece que o valor será reajustado, até 2015, com base no INPC - Índice Nacional de Preços ao Consumidor do ano anterior mais a variação do PIB de dois anos antes.
O novo salário mínimo de R$ 622 terá impacto de R$ 23,9 bilhões nos gastos públicos em 2012. A maior parte desse montante corresponde aos benefícios da Previdência Social no valor de um salário mínimo, que serão responsáveis pelo aumento de R$ 15,3 bilhões nas despesas do INSS.
Veja abaixo a íntegra do decreto.
DECRETO Nº 7.655, DE 23 DE DEZEMBRO DE 2011.
Regulamenta a Lei nº 12.382, de 25 de fevereiro de 2011, que dispõe sobre o valor do salário mínimo e a sua política de valorização de longo prazo.
A PRESIDENTA DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, inciso IV, da Constituição, e tendo em vista o disposto no art.  da Lei nº 12.382, de 25 de fevereiro de 2011,
DECRETA:
Art. 1º A partir de 1º de janeiro de 2012, o salário mínimo será de R$ 622,00 (seiscentos e vinte e dois reais).
Parágrafo único. Em virtude do disposto no caput, o valor diário do salário mínimo corresponderá a R$ 20,73 (vinte reais e setenta e três centavos) e o valor horário, a R$ 2,83 (dois reais e oitenta e três centavos).
Art. 2º Este Decreto entra em vigor no dia 1º de janeiro de 2012.
Brasília, 23 de dezembro de 2011; 190º da Independência e 123º da República.
DILMA ROUSSEFF
Guido Mantega
Paulo Roberto dos Santos Pinto
Miriam Belchior
Garibaldi Alves Filho
Este texto não substitui o publicado no DOU de 26.12.2011
Autor: Assessoria de Imprensa

Silicone de empresa francesa não tinha aprovação, diz advogado


Por Marc Joanny e Jean-François Rosnoblet
TOULON, 27 Dez (Reuters) - O advogado da empresa francesa que está no centro do escândalo de próteses mamárias disse à Reuters nesta terça-feira que a maioria das próteses vendidas pela companhia desde 1991 eram produzidas com silicone sem aprovação.
O advogado Yves Haddad, que representa a Poly Implant Protheses (PIP), hoje desativada, afirmou que a empresa vendia dois tipos de próteses: aquelas conhecidas como "simples", produzidas com silicone sem o selo de aprovação, e um produto mais sofisticado utilizando um silicone aprovado, destinado a clientes mais ricos.
"Existe um produto feito pela PIP que não recebeu oficialmente a aprovação (da agência regulatória) e nesse sentido houve violação de regulamentos", disse Haddad à Reuters.
Nenhuma acusação foi apresentada, mas um tribunal de Marselha deve anunciar acusações de fraude no próximo ano, disseram fontes jurídicas à Reuters.
Uma investigação sobre homicídio culposo foi aberta depois que uma mulher francesa morreu em 2010 com câncer, e tinha implantes da PIP.

Clipping - O Estado de S. Paulo - Novo presidente do TJ de SP compara atos do CNJ aos da ditadura


Para desembargador que vai comandar TJ paulista, corte no epicentro da atual crise da Justiça, conselho despreza a lei
A uma semana de sua posse como presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, a maior corte do País, o desembargador Ivan Ricardo Garisio Sartori comparou práticas investigativas do Conselho Nacional de Justiça às da "ditadura". "Vamos respeitar a lei, então não precisa mais de Legislativo", adverte. "Processo não precisa mais, já vai lá, avoca tudo, não tem defesa. Não é assim. O CNJ tem que observar o devido processo legal. Se o Legislativo criou um procedimento, se existe uma Constituição vamos respeitá-la. Sem que se siga esses procedimentos vai sim se tratar de uma ditadura, vai se voltar aos tempos da ditadura."
Ivan Sartori, 54 anos, recebeu o Estado na segunda-feira, 26, no quinto andar do Palácio da Justiça paulista. É uma voz poderosa a atacar a devassa do CNJ sobre juízes e servidores de todo o País. As investigações do órgão de fiscalização do Judiciário sobre irregularidades nos Estados foram bloqueadas pelo Supremo Tribunal Federal. A decisão ampliou a polêmica em torno da ministra Eliana Calmon, corregedora nacional de Justiça, que já havia descontentado a classe ao apontar "bandidos de toga" no Judiciário.
Na semana passada, no último dia de funcionamento do STF em 2011, os ministros Março Aurélio Mello e Ricardo Lewandowski atenderam a pedidos de associações de juízes e deram liminares suspendendo investigações do CNJ.
Uma dessas apurações é sobre o suposto favorecimento irregular a magistrados do TJ de São Paulo, que teriam recebido de uma só vez benefícios de uma decisão judicial sobre auxílio-moradia, em detrimento de colegas que obtiveram o pagamento em parcelas.
Sartori disse que determinou a elaboração de um levantamento sobre os pagamentos realizados desde 1996 para verificar se há "fundamento" nos repasses antecipados a determinados juízes. Para ele, o desrespeito à "fila" teria justificativa em caso de doença grave do beneficiário ou de um parente.
Caso se constate a irregularidade dos pagamentos, o futuro presidente do TJ, que tomará posse na segunda-feira, defende a imposição de descontos nos vencimentos dos juízes favorecidos como forma de compensar os repasses antecipados.
Qual deve ser o papel do CNJ?
Esse assunto foi polarizado de uma forma um pouco canhestra. Todos estão falando a mesma língua. Querem a fiscalização do CNJ sobre eventuais irregularidades que existem no Judiciário, que não são muitas, só pegar número de juízes e verificar o que se tem de processos. Aqui no TJ sempre apuramos tudo o que surgiu aqui nunca houve omissão. Fui do Órgão Especial, era até um pouco oposição no começo, e via que detalhadamente sempre se apurou todas as condutas dos magistrados. O que está acontecendo é que um entendimento é no sentido de que o CNJ seja aquele big organismo que vai abarcar tudo o que surge sobre problemas com juízes e outro não, outro quer uma racionalização, quer o respeito ao devido processo legal, às garantias constitucionais que todo réu tem que é o direito a recurso, ao devido processo legal.
É isso que o CNJ faz?
Você não pode atropelar o devido processo legal, ou seja, tirar o direito de defesa, o direito de recurso, que está previsto no artigo 55 da Constituição. Atropelar tudo aquilo para poder decidir de uma vez só. Mesmo porque cada tribunal tem suas peculiaridades. O CNJ, para decidir alguma questão, tem que saber quais são essas peculiaridades. Nada é julgado objetivamente, tudo é julgado subjetivamente. Por trás dos processos existem pessoas. Nenhum réu gostaria de ver o seu processo atropelado, passando por cima da estrutura do devido processo legal para que fosse investigado diretamente no Supremo. Isso acontece em casos excepcionais, com a prerrogativa de foro que não é uma boa coisa para quem a tem, se analisar bem porque ele (réu) perde todo o direito de recurso.
O CNJ atropela direitos?
São exceções previstas expressamente na Constituição. Essa exceção de atropelar todas as instâncias, eliminar esse direito aos recursos com relação aos juízes em procedimentos disciplinares administrativos não existe na Constituição. Então, não podemos simplesmente atropelar tudo o que está previsto na legislação. Existem regras legais, o processo tem que seguir seu tramite. Qualquer réu, por mais sanguinário que seja, tem direito ao recurso, tem direito à defesa.
O CNJ não tem condições de investigar as corregedorias?
O CNJ não tem estrutura para investigar todos esses processos. Como é que o CNJ vai assumir essa estrutura se ele mesmo admite que é difícil inspecionar o Tribunal de São Paulo? Não sonegamos informações, todas foram prestadas e isso a própria ministra Eliana Calmon (corregedoria nacional de Justiça) disse. Repassamos ao CNJ inclusive dados sobre as folhas de pagamentos. Entregamos tudo, tudo. Não há mais nada a ser entregue. Acontece que o CNJ não tem estrutura para investigar o Brasil inteiro dessa forma. E vai querer agora pinçar um determinado processo sem um motivo, sem um fundamento? Por que não se observa o devido processo legal e, mediante recurso, chega-se ao CNJ? O CNJ não está impedido de fiscalizar as corregedorias. Pode sim avocar o processo que entender, aquele caso que não está tendo o tratamento devido. Ambos os lados querem investigação, só que um quer que se observe as regras constitucionais, e o outro quer que se atropele essas regras. Não pode ser feito assim, quer porque isso fere a garantia individual, quer porque o CNJ não tem estrutura para fazer isso. Então, vira contra o interesse público.
A ministra Eliana Calmon atropelou essas garantias?
No mérito ela está certa, na forma não está agindo corretamente. Primeiro não podemos generalizar uma situação, bandidos de toga. Você lança uma denominação que traz reflexo em to9da a classe e não é verdade, Os juízes trabalham muito, enxugam gelo, com prejuízo do convívio familiar. Eu não me senti ofendido porque não devo nada, absolutamente nada. Mas foi um ponto negativo para a classe, trouxe a opinião pública contra a magistratura e isso não é bom. Esse é o problema. Isso dificulta o trabalho. Eu concordo que existam pessoas que têm desvio de conduta, mas não digo que sejam bandidos de toga, como se fosse pessoal de alta bandidagem, alta corrupção. Um caso ou outro tem.
Quem vende sentença é bandido?
Têm casos difíceis, eu sei que têm, tem que se investigar. É preciso verificar. Quem vende sim, lógico, é abominável. Quem vende é bandido. Mas a forma como foi colocada, no contexto ela (a ministra) jogou assim. Uma forma ampla, a forma como ela colocou acabou sendo generalizada e os colegas se sentiram ofendidos. Eu conheço a ministra Eliana, mulher extremamente séria. Não estou reprovando a ministra, a intenção dela é boa. Mas acho que a forma como ela jogou a situação na imprensa propiciou essa situação negativa contra nós. Ela pretende investigar, acertar, mas não pode ser assim, de uma forma que tenha provocado sensacionalismo em cima disso. Acho que a imprensa também usa um pouco esse sensacionalismo para poder ter mais circulação da mídia.
Houve violação a sigilo de 217 mil juízes e servidores?
As associações (dos juízes) dizem que sim, ela (ministra) diz que não. Você obtém declaração de Imposto de Renda de determinado magistrado você está quebrando o sigilo dele. Agora, se tem uma informação do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) sobre movimentação suspeita aí é um pé para que ela (ministra) peça a queba do sigilo ao Judiciário. Essas declarações de renda têm que ser entregues, colocadas à disposição dos órgãos de fiscalização. O problema todo é que mesmo nós aqui no Conselho Superior da Magistratura não podemos nos valer dessas declaração sem autorização judicial porque existe a garantia constitucional do sigilo fiscal. Ninguém de nós gostaria de ter seu sigilo quebrado do nada, sem autorização judicial.
O presidente do STF, ministro Cezar Peluso, recebeu R$ 700 mil em atrasados a título in clusive de auxílio moradia.
Os juízes têm algumas verbas acumuladas, férias que acabaram não sendo pagas, parcela de equivalência por auxílio moradia concedida por lei estendida ao Supremo que se estendeu aos demais juízes. Eu ainda não estou na administração do TJ, mas já mandei fazer um levantamento de quem recebeu alguma parcela de forma a quebrar a isonomia, desde 1996. Pedi o levantamento, quero examinar nome por nome. Vou colocar com os colegas que tiveram esse problema. Vamos verificar se têm justificativa porque pode haver. Uma doença séria, em alguém da família, por exemplo, é uma justificativa razoável. Ou pessoas que se desligaram do tribunal. Agora, não sei sobre os dois ministros mencionados, eu não constatei de conhecimento próprio. Eles é que falaram. Também não sei qual foi a justificava, eu quero examinar. Eles se desligaram do tribunal e por isso receberam? Eu não sei. Vou verificar a situação de cada magistrado. Vínhamos recebendo esse valor parceladamente, até módicas parcelas. A verdade é essa. Alguns colegas receberam adiantado.
Autor: O Estado de S. Paulo


sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Em sete anos de atuação, CNJ puniu 49 magistrados


O Conselho Nacional de Justiça, que completa sete anos nesta sexta-feira (30/12), já condenou 49 magistrados, segundo reportagem do jornal O Globo. A maioria — 24 — foi punida com a aposentadoria compulsória, 15 foram afastados em decisões liminares; 6 colocados à disposição sem poder julgar; dois foram removidos de seus postos originais e dois censurados.
Os processos iniciados no próprio CNJ somam 38, apenas 11 são de corregedorias locais. Segundo dados do CNJ, estão em andamento no órgão, atualmente, 2.595 processos, incluindo desde as reclamações contra magistrados até sindicâncias.
A Ordem dos Advogados do Brasil conta que o CNJ possui em tramitação ou arquivados 15 processos contra presidentes dos tribunais de Justiça dos estados e 18 corregedores dos TJs respondem ou já responderam a processos no próprio órgão. Nos tribunais regionais federais, três dos cinco corregedores foram ou são alvo do CNJ. Dos cinco presidentes de tribunais regionais federais, dois possuem processos em tramitação ou arquivados. 
Entre os magistrados punidos está o ex-ministro do Superior Tribunal de Justiça, Paulo Medina, que foi obrigado a se aposentar depois de ser acusado de participação em esquema para beneficiar donos de bingos. Outro que teve aposentadoria compulsória foi o desembargador Carreira Alvim, do Tribunal Regional Federal da 2ª Região.
O presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros, Nelson Calandra, elogia a atuação do CNJ, mas defende que as corregedorias dos próprios tribunais se encarreguem das investigações. Já o presidente da OAB no Rio de Janeiro, Wadih Damous, diz que as corregedorias regionais são cobertas por "um sentimento corporativista". O conselheiro mais antigo do CNJ, Marcelo Nobre, também critica a recente decisão do Supremo Tribunal Federal que limitou o poder de investigação da instituição.
Ouvidoria
De outubro até 18 de dezembro deste ano, a ouvidoria do CNJ registrou 4.622 manifestações. O tema que mais preocupa os usuários é a morosidade processual, com 1.315 reclamações. Em seguida, o órgão teve 211 registros de pessoas que reclamaram sobre as decisões judiciais. O terceiro tema com mais manifestações é a atuação dos magistrados, com 228 registros. Desse total, 166 eram reclamações e 44 denúncias. A atuação do CNJ aparece em quarto lugar, com 190 manifestações, sendo 180 elogios.

A maior parte das manifestações registradas pelo CNJ — 903 — foram de servidores públicos; em seguida, os advogados foram responsáveis por 817 dos contatos com os órgãos; os aposentados representam 479 das manifestações e os empregados da iniciativa privada, 357. Os estudantes registram 327 contatos com a ouvidora do CNJ e desempregados, 318. O balanço aponta ainda que 60 registros foram feitos por presidiários. O conselheiro Wellington Cabral Saraiva, comenta que o objetivo da ouvidora é servir de canal de comunicação “direta entre o cidadão e o Conselho”. Com informações da Assessoria de Imprensa do CNJ. 
Revista Consultor Jurídico, 29 de dezembro de 2011
Fonte: http://www.conjur.com.br/2011-dez-29/sete-anos-atuacao-cnj-contabiliza-49-magistrados-punidos

Não basta a Justiça ser célere, precisa ser acessível

A Secretaria de Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça foi criada com o objetivo de promover, coordenar, sistematizar e angariar propostas e estudos voltados ao aprimoramento e reforma do Sistema de Justiça Brasileiro, de modo a torná-lo mais acessível, efetivo e próximo de toda a sociedade brasileira.
Sua atuação é pautada na constatação de que a ampliação do acesso à Justiça para todos os brasileiros pode ser alcançada com o estímulo a uma série de medidas e também na execução de políticas voltadas em promover a democratização da Justiça no Brasil. Seu papel principal consiste em ser um órgão de articulação entre as instituições que compõem o Sistema de Justiça, governos estaduais e municipais, entidades da sociedade civil, academia e organismos internacionais com o objetivo de propor e difundir ações e projetos de aperfeiçoamento da Justiça, além da elaboração e aperfeiçoamentos de propostas normativas de modernização da gestão do Judiciário.
Poucos problemas nacionais possuem tanto consenso no tocante aos diagnósticos quanto à questão judiciária. A morosidade dos processos judiciais, o não cumprimento e eficácia de suas decisões e os limites da transparência retardam o desenvolvimento nacional, desestimulam investimentos, propiciam a inadimplência, geram impunidade e colocam em dúvida a crença dos cidadãos ao regime democrático de direito.
O esforço engendrado na condução dos dois Pactos Republicanos proporcionou avanços significativos na aprovação de projetos de Lei, bem como na consecução de diversas políticas públicas.
Ao longo desses 23 anos de promulgação da nossa Constituição Cidadã, a sociedade brasileira passou a ter mais consciência dos seus direitos, ao verem colocadas em causa as políticas sociais e de desenvolvimento do Estado. Nessa perspectiva, onde os objetivos para o fortalecimento da democracia são adensados à ampliação e à consolidação de direitos, é necessário evitar que os propósitos de aperfeiçoamento do sistema de Justiça Brasileiro sejam dominados, tão somente, pelo ideal da celeridade processual.
Do ponto de vista de uma revolução democrática da Justiça, não basta apenas à celeridade, deve-se garantir, acima de tudo, uma Justiça cidadã, aberta e próxima ao povo.
Diante desse contexto, nos últimos anos, por entender que se trata de uma pauta essencial à efetivação da cidadania de todos os brasileiros, o governo vem realizando ações voltadas ao aprimoramento do sistema de Justiça e de suas instituições, sempre respeitando a independência dos Poderes e promovendo a articulação com o Judiciário e o Legislativo. Dentre as iniciativas empreendidas, destacam-se pesquisas, estudos, reformas normativas e políticas públicas, desenvolvidas em parceria com o Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública, advocacia, estados e municípios.
Paralelamente, e dando seguimento à reforma deflagrada com a Emenda Constitucional 45/2004, avanços normativos relevantes vêm sendo alcançados, a exemplo dos 21 projetos de lei aprovados no âmbito do “II Pacto Republicano de Estado por um sistema de Justiça mais acessível, ágil e efetivo”, compromisso assinado, em 2009, entre os chefes dos três Poderes.
Vale relembrar, nesse contexto, que foram aprovadas leis importantes como a Lei Complementar 132/2009, segundo a qual a Defensoria Pública pode se organizar em núcleos ou núcleos especializados, priorizando as regiões com maiores índices de exclusão social e adensamento populacional. Ainda sobre a Defensoria, cabe salientar a Lei 12.313/2010, que altera a Lei de Execução Penal (7.210/1984) e inclui a instituição entre os órgãos da execução penal, fazendo com que a assistência jurídica seja integral e gratuita aos sentenciados em liberdade ou reclusos, egressos e seus familiares que não podem arcar com um advogado privado.
Cita-se ainda, a Lei 12.153/2009 que criou os Juizados Especiais da Fazenda Pública no âmbito dos estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos municípios; a Lei 12.275/2010 que dispõe sobre a necessidade do depósito recursal, no valor de 50% do recurso que se deseja destrancar, para a interposição de Agravo de Instrumento na Justiça do Trabalho; a Lei 12.322/2010 que transforma o Agravo de Instrumento interposto contra decisão que não admite Recurso Extraordinário ou Especial em Agravo nos próprios autos. São exemplos de normas que vieram para aprimorar o acesso ao sistema de Justiça, além de proporcionarem mecanismos de agilidade e efetividade da prestação jurisdicional.
Neste ano os avanços também foram significativos. Destacam-se a Lei 12.440 que institui a Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas (CNDT). Sancionada pela presidenta Dilma Rousseff, no mês de julho deste ano, a norma exige das empresas que quiserem participar de licitação ou contratar com a administração pública a apresentação da CNDT, comprovando o cumprimento de decisões judiciais na esfera trabalhista. Além de prestigiar as empresas que estão em dia com os direitos trabalhistas, a Lei garante efetividade ao cumprimento de decisões judiciais em favor dos trabalhadores.
Ainda, a Lei 12.551 regulamenta o “Teletrabalho” e passa a não fazer distinção entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador e o executado no domicílio do empregado e o realizado a distância, desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego, equiparando, assim, os meios telemáticos e informatizados de controle e supervisão aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho, para fins de subordinação jurídica. Ambas as matérias foram tratadas no II Pacto Republicano no item “Aperfeiçoamento da legislação material trabalhista, visando a ampliar, em especial, a disciplina de novas tutelas de proteção das relações do trabalho”.
Cabe destacar também a aprovação da Lei 12.433 que prevê a troca de parte do tempo da pena por estudo ou trabalho. O detento do regime fechado ou semiaberto pode optar por 12 horas de frequência escolar ou três dias de trabalho no lugar de um dia de cumprimento da pena. A matéria também foi tratada no II Pacto Republicano no item “Revisão da Lei de Execução Penal, no sentido de aperfeiçoar o sistema carcerário, garantindo tanto a função ressocializante da pena quanto a segurança pública”.
Outro assunto que merece destaque são as medidas cautelares. Este ano a Lei 12.403, que trata do tema, entrou em vigor e reconhece os mecanismos usados pelo juiz durante o processo para garantir a devida condução da investigação criminal e a preservação da ordem pública. Alguns exemplos das novas medidas cautelares são: o monitoramento eletrônico, recolhimento domiciliar no período noturno, suspensão do exercício de função pública ou de atividade econômica, proibição de viajar e de frequentar lugares ou de manter contato com pessoas determinadas pelo juiz. Para debater sobre o assunto, o Ministério da Justiça realizou encontro sobre a “Nova Lei das Cautelares” para avaliar os impactos da mudança legislativa no sistema prisional, no processo criminal e na comunidade jurídica. Este tema também recebeu tratamento prioritário por fazer parte do II Pacto Republicano.
Outro projeto do II Pacto Republicano e que também merece destaque entre os trabalhos realizados pela Secretaria é a aprovação do PL 5.456/2009, sancionada pela Presidenta da República no último dia 23 de dezembro. A Lei 12.562 dispõe sobre o processo e julgamento da representação interventiva perante o Supremo Tribunal Federal. Medida excepcional de supressão temporária da autonomia de determinado ente federativo, fundada em hipóteses taxativamente previstas no texto constitucional, que visa à unidade e preservação da soberania do Estado Federal e da autonomia da União, dos estados, do DF e dos municípios. Seu objeto é qualquer lei ou ato normativo do Poder Público, no exercício de sua competência constitucionalmente deferida que venha a violar um dos princípios constitucionais, como: i) forma republicana, sistema representativo e regime democrático; (ii) direitos da pessoa humana; (iii) autonomia municipal; (iv) prestação de contas da administração pública direta e indireta: e (v) aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos estaduais, compreendida a proveniente de receitas de transferência, na manutenção e desenvolvimento do ensino.
Destaque ainda para a Lei 12.527 que disciplina o acesso à informação. A lei brasileira, que pretende tornar o Estado ainda mais transparente e democrático, regulamenta a consulta de documentos públicos e atinge Executivo, Legislativo, Cortes de Contas, Judiciário e Ministério Público, e prevê a criação de serviços de informação para atender o cidadão e protocolar requerimentos de acesso a informações, bem como instâncias para analisar eventuais recusas.
A mais polêmica proposta debatida este ano é a que propõe o trânsito em julgado na segunda instância. Batizada de “PEC do Peluso” a proposta inaugurou debate em torno da efetividade da Justiça brasileira. O processo em torno desta PEC, ora em tramitação no Senado Federal apresentado pelo senador Ricardo Ferraço, consagra uma sucessão de debates em torno do preceito constitucional da duração razoável do processo, redução da impunidade e no desafogamento do sistema, criando condições para o provimento da justiça rápida e acessível que a sociedade demanda. Contrapondo essa premissa, o que trava o Judiciário, ressaltam os contrários a PEC, não são as inúmeras oportunidades abertas aos cidadãos de recorrer das decisões de instâncias inferiores, mas a quantidade dos recursos impetrados pelo setor público, que lidera de longe as estatísticas dos maiores litigantes. Outro argumento é que a proposta atropela o direito de defesa e o princípio da presunção de inocência, ambos, também, assegurados pela Constituição.
Diante desse cenário, devemos antes debater as verdadeiras causas da morosidade, o distanciamento e a falta de confiança na Justiça, o custo e a dificuldade de acesso, a judicialização excessiva, o excesso de formalismo, e ainda, investir na orientação da sociedade quanto seus direitos e deveres.
De outro lanço, iniciado em 2008, a agenda de democratização do acesso à Justiça ganhou destaque com a implementação de políticas públicas em parceria com instituições do sistema de Justiça, por meio de recursos do Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci).
Inaugurando uma nova concepção de Justiça próxima a sociedade alçamos como política de pacificação de conflitos o projeto Justiça Comunitária, que tem como objetivo estimular comunidades a construir e a escolher seus próprios caminhos para a realização da Justiça, de forma pacífica e solidária, por meio da implementação de Núcleos de Justiça Comunitária em que são realizadas atividades de educação e conscientização em direitos, articulação de redes sociais e mediação comunitária de conflitos. Foram implementados, desde 2008, 46 Núcleos, com investimentos da ordem de R$ 15 milhões. Neste ano assinamos parceria para instalação de mais sete novos Núcleos, sendo três no Rio Grande do Sul, dois em São Paulo (Diadema e Santo André), um na Paraíba (João Pessoa) e Rio Grande do Norte (Natal), com investimento que somam R$ 5 milhões. Os núcleos de Justiça Comunitária já capacitaram 700 agentes de mediação e já atenderam 42 mil pessoas que deixaram de ingressar com ações na Justiça e tiveram seus problemas solucionados de forma negociada.
No que tange ao combate a violência doméstica contra a mulher, cabe citar a política de efetivação da Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006), com foco na implantação de Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, Núcleos Especializados de Defesa da Mulher na Defensoria Pública e Núcleos e Promotorias Especializadas no âmbito do Ministério Público, com previsão de atendimento multidisciplinar às vítimas. Já foram implementados 104 equipamentos públicos voltados às mulheres vítimas de violência com apoio da Secretaria de Reforma do Judiciário, entre 2008 e 2010, sendo investidos mais de R$ 32 milhões. Nesse sentido, inauguramos no último dia 21 de novembro seis novos Juizados de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher na cidade de São Paulo, com competência para julgar todas as ações judiciais que envolvam violência doméstica. Os Juizados têm papel fundamental na celeridade desses processos e na efetivação da Lei Maria da Penha. Para este ano, foram conveniados a implantação de mais cinco Juizados Especializados no estado do Rio de Janeiro, bem como a instalação de um Núcleo no âmbito da Defensoria do Rio Grande do Norte e uma Promotoria Especializada no Ministério Público do Estado do Piauí, com investimentos de R$ 2,5 milhões.
A ação de Assistência Jurídica aos Presos, Presas e seus Familiares busca garantir a esse público tratamento digno e respeito aos seus direitos, por meio da implementação, nas Defensorias Públicas, de Núcleos Especializados para esse fim. Foram apoiados, nos últimos anos, 20Núcleos em Defensorias Públicas estaduais e 17 Sedes de Assistência Jurídica ao Preso, Presa e seus Familiares da Defensoria Pública da União, investindo-se mais de R$ 15 milhões nesses projetos. Só em São Paulo foram, em média, 2.417 atendimentos mês nos estabelecimentos prisionais da capital. Em Minas Gerais, a meta é atender individualmente todos os custodiados das 130 unidades prisionais, abrangendo 36.901 presos, dos quais 2.072 mulheres e 34.829 homens. O projeto prevê também o atendimento a 3.690 familiares de presos.
Cabe salientar, quanto às ações voltadas à mediação de conflitos voltadas aos operadores do Direito, a realização de Cursos de Capacitação em Mediação em parceria com o Conselho Nacional de Justiça e a criação de Núcleos de Mediação em faculdades de Direito, por meio do projeto “Pacificar”. Estas iniciativas visam difundir, entre os operadores e futuros operadores do sistema de Justiça, a cultura da mediação e estimular práticas de resolução consensual de conflitos. Desde 2008, foram realizados 42 cursos voltados aos operadores do Direito, com investimentos de R$ 3 milhões, e criados 18 núcleos de mediação em faculdades, em que foram investidos quase R$ 2 milhões.
No total, considerando essas e outras ações de democratização do acesso à Justiça, foram investidos, nesses 4 anos, cerca de R$ 100 milhões na implementação de mais de 270 projetos em todas as unidades da Federação, dentre os quais 187 equipamentos públicos, em parceria com o Poder Judiciário, Defensoria Pública, Ministério Público, governos estaduais e municipais, beneficiando cerca de 400 mil pessoas diretamente.
Ainda nesse campo, a Secretaria de Reforma do Judiciário em parceria com atores do sistema de Justiça implementou projetos relacionados à Justiça Juvenil, como por exemplos, projetos-piloto de Justiça Juvenil Restaurativa, com foco em adolescentes em conflito com a lei, objetivando promover a aplicação de métodos de negociação e mediação de conflitos que incluem a vítima, o agressor, familiares e comunidade envolvendo-os no processo restaurador. Com base em um paradigma criminológico integrador, as atividades desenvolvidas nos núcleos de Justiça Juvenil Restaurativa buscam conciliar os interesses e expectativas de todas as partes envolvidas no problema criminal, por meio da pacificação da relação social conflituosa que o originou. Três núcleos novos projetos iniciaram atendimentos sendo um em São José de Ribamar no estado do Maranhão e dois em Porto Alegre (RS).
Firmamos ainda, neste ano parceria com o Ministério Público do Rio Grande do Norte para a instalação de mais um núcleo de Justiça Juvenil Restaurativa. O trabalho será realizado nas escolas de ensino fundamental do município de Natal (RN) e terá como foco principal pacificar os conflitos entre estudantes e professores, estudantes e colegas por meio da utilização das práticas restaurativas.
Ainda no campo da infância e juventude implementamos, em parceria com o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, cinco novos projetos-piloto para a tomada de depoimento especial de crianças e adolescentes vítimas de violência em quatro Varas Especializadas da Infância e da Juventude nas Comarcas de Campinas, São Bernardo do Campo, São Caetano do Sul e Atibaia, e um Juizado Especializado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher na Capital.
Também foram firmadas novas parcerias com o Tribunal de Justiça de São Paulo e com o Tribunal de Justiça do Estado do Amapá com vistas à implantação de novos núcleos do projeto que deve ocorrer em 2012.
Investindo em políticas de resolução de demandas na seara extrajudicial, destacamos a parceria firmada com a Defensoria Pública do estado do Acre com vistas à implantação do projeto “Reconhecer é Legal” que tem por objetivo a realização de exames de DNA para reconhecimento de paternidade de forma extrajudicial. Havendo acordo entre as partes o valor da realização do exame será arcado pela Defensoria Pública, com recursos do convênio firmado com a Secretaria de Reforma do Judiciário, e sendo positivo resultado os autos irão ao Poder Judiciário apenas para homologação judicial.
É preciso destacar, no entanto, que, apesar dos avanços alcançados nos últimos anos, percebeu-se que grupos em situação de extrema vulnerabilidade permanecem encontrando dificuldades em acessar a Justiça e efetivar seus direitos. Deu-se início, portanto, a duas ações: Acesso à Justiça para a População em Situação de Rua e Casa de Direitos. A primeira envolve ações de sensibilização e capacitação voltadas para os operadores do Direito, além da implementação de serviços especializados de atendimento à População em Situação de Rua pelas Defensorias Públicas. Este ano realizamos três seminários de discussão e sensibilização mapeando formas de garantir o atendimento Jurídico à População em Situação de Rua, promovendo um verdadeiro olhar no fortalecimento da cidadania e dos direitos. Assinamos, ainda, parcerias com a Defensoria Pública de São Paulo e do Rio de Janeiro para atendimento especializado nesse seguimento.
As Casas de Direitos, por sua vez, são espaços que vêm sendo implementados em comunidades recém-pacificadas do Rio de Janeiro, objetivando disponibilizar à população serviços públicos de acesso à Cidadania e à Justiça, como emissão de documentos, atendimento jurídico por parte da Defensoria Pública, do Ministério Público e do Poder Judiciário, núcleos de mediação comunitária e realização de palestras sobre Cidadania e Justiça. Conseguimos ainda, com a parceria da Caixa Econômica Federal recursos para reformar e adaptar espaços para a instalação da Casa de Direitos na Cidade de Deus e no Complexo do Alemão.
No fortalecimento da Defensoria Pública, em iniciativa inédita propomos, perante o Conselho Monetário Nacional, em conjunto com Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) aprovação de linha de crédito exclusiva para modernização e fortalecimento Defensoria Publica dos estados. Serão disponibilizados, a título de empréstimos, R$ 300 milhões a fim de equipar, modernizar e fortalecer as defensorias públicas. Faz parte dessa proposta o desenvolvimento de programa de acompanhamento e monitoramento da execução penal fazendo com que o defensor público acompanhe, diariamente, todo o andamento do processo penal, bem como a fase da execução da pena.
Não há reforma sem elementos que possam embasar mudanças no sistema. Com vistas a obter informações sobre o sistema de Justiça, realizamos o I Diagnóstico da Advocacia Pública no Brasil e demos início à elaboração do II Diagnóstico do Ministério Público. Além disso, lançamos a pesquisa pioneira sobre proposições legislativas, instrumentos normativos Federais e decisões de Tribunais Superiores que tratam dos direitos de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais (LGBT). Foram mapeados 54 normas executivas, 97 proposições legislativas em tramitação no Congresso Nacional e 319 acórdãos sobre o tema LGBT nos cinco tribunais superiores.
A fim de ampliar e simplificar o acesso de microempresas e empresas de pequeno porte a mecanismos de solução de conflitos e de recuperação lançamos este ano cartilha que informa como microempresas e empresas de pequeno porte podem ter acesso a alternativas para evitar a falência de seus empreendimentos. Lançada no mês de agosto, em Brasília, a cartilha Recuperação Judicial de Empresas — Guia Prático, traz informações sobre processos de recuperação, que visam saldar compromissos financeiros, negociar com credores e moldar um plano de recuperação factível, a fim de melhorar o ambiente competitivo para gerar mais empregos e informar o pequeno e micro empresário das alternativas para os seus negócios. Vale lembrar que existe no Brasil cerca de seis milhões de microempresas (ME) e empresas de pequeno porte (EPP), o que representa 97% de todas as empresas brasileiras. Juntas, empregam aproximadamente 52% dos trabalhadores urbanos do país e geram 20% do PIB.
Mesmo que os avanços conquistados, em especial nesses últimos 8 (oito) anos, ainda sejam insuficientes para a universalização e democratização do Poder Judiciário e das instituições do sistema de Justiça, entendemos que as reformas normativas, de gestão e de implementação de políticas de democratização têm avançado e contribuído para construirmos uma JUSTIÇA mais pacificadora, próxima e acessível da sociedade.
Marcelo Vieira de Campos é secretário da Secretaria da Reforma do Judiciário do Ministério Justiça.
Revista Consultor Jurídico, 29 de dezembro de 2011


Relatório traz índice de efetividade da Justiça no mundo

A organização The World Justice Project (WJP) fez uma pesquisa de fôlego para avaliar a situação do Estado de Direito em 66 países de todas as regiões do mundo. A organização mede, na verdade, a percepção da população sobre a efetividade da Justiça. O relatório final, de 157 páginas, com o título de Índice do Estado de Direito (Rule of Law Index), faz uma radiografia da Justiça no mundo. Traz um ranking mundial, rankings regionais e rankings de grupos de nações por faixas de renda semelhantes. Cada ranking classifica os países utilizados como amostra pelo nível de respeito que cada nação atribui ao império da lei, em praticamente todas as áreas da Justiça.
Os principais pontos do relatório da WJP, que está em sua quarta edição anual, serão apresentados pela revista Consultor Jurídico em uma série de textos publicados a partir desta quinta-feira (29/12). Com a ajuda de diversas instituições de pesquisa, a WJP trabalhou com grupos de especialistas em cada um dos 66 países e mais de mil entrevistados. Deles vieram as informações para a elaboração do relatório e dos rankings.
Todos responderam a um amplo questionário, que foi dividido em nove fatores, desagregados em 52 subfatores (clique aqui para ler), escolhidos para “medir” a situação do Estado de Direito em seus países. Por serem dados derivados de opiniões de pessoas, o relatório usa reiteradamente a expressão “há uma percepção de que...”. Enfim, de posse dos dados, a WJP atribuiu pontuações de 0 a 1 para cada um dos fatores, o que resultou na pontuação conferida a cada país.
Na confecção das tabelas, a WJP utilizou apenas oito dos noves fatores (deixou de fora o fator Justiça Informal). As tabelas trazem as classificações dos países no mundo, na região e por classe de renda, em cada um dos fatores, e as pontuações atribuídas a cada país, também cada um dos fatores. Não traz uma classificação geral, com base na média das pontuações atribuídas. A revista ConJurcalculou a média das pontuações para elaborar a classificação geral dos países pesquisados (cliqueaqui para ler a íntegra do relatório original, em inglês).
A maior pontuação do Brasil (pelo sistema de 0 a 1 da WJP) foi 0.67, em dois quesitos, e a menor 0.48, em um quesito. A média geral, considerados os oitos quesitos, foi de 0.69. O Brasil ficou na 26ª posição no ranking mundial (junto com a Jordânia), 2ª na América Latina (atrás do Chile) e 1ª entre os países do BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China), o que foi um destaque no relatório da WJP, porque esses são os países almejados pelas grandes firmas de advocacia do mundo.
No ranking mundial feito a partir da média dos oito quesitos, o primeiro lugar foi ocupado pela Suécia, seguida da Noruega e da Nova Zelândia. Os três últimos lugares são ocupados por Libéria, Camboja e Paquistão. O Brasil ocupou o 24ª lugar, sua melhor colocação, nos quesitos Ausência de Corrupção e Acesso à Justiça Civil. A pior colocação do país foi no fator Ordem de Segurança: dentre os 66 países, o Brasil ficou com a 51ª colocação.
Clique aqui para ver a colocação dos países no ranking geral.
Confira a posição dos 66 países de acordo com os oito critérios avaliados pelo WJP:
João Ozorio de Melo é correspondente da revista Consultor Jurídico nos Estados Unidos.
Revista Consultor Jurídico, 29 de dezembro de 2011

Carreira da magistratura precisa de reorganização

Eu entendo o sofrimento de muitos companheiros magistrados, crispados com as providências da Corregedoria Nacional de Justiça no sentido do levantamento de dados à conferência de nossa higidez pessoal no exercício funcional específico. Mas também acredito que as premissas para tal sofrimento, de acordo com o contexto normativo em que nos encontramos no presente momento da vida política nacional, são exorbitantes e logo cedem a uma visão isenta e desapaixonada dos acontecimentos.
Ninguém é absolutamente livre de erros nesta vida. Assim também a ministra Eliana Calmon e todos nós, magistrados. Tentar desqualificá-la de seu exercício corrigente é, portanto, tarefa inglória. O que se tem afirmado é que ela, na atual quadra, está determinada a fazer a coisa certa e isso não tem nada a ver com exposição desabusada e ilegal do universo dos magistrados da nação. Tem a ver com transparência que é um dever de todos nós ao qual não deveríamos sequer ter de ser convocados, porque, antes, já nos deveríamos expor de modo espontâneo. É da natureza do exercício da função pública.
Mas, o que se tem observado é que velhos costumes ainda continuam ativados no meio judicial, os quais explicam, por exemplo, que um número não desprezível de juízes nem se deem conta da responsabilidade legal de enviar suas declarações de ajuste anual, prestadas à Receita Federal, também às Corregedorias respectivas para os devidos fins. Os quais não se reduzem, obviamente, ao mero arquivo dos dados que elas contém, mas na pesquisa permanente e confirmatória de nossa higidez pessoal e funcional. Porque o Juiz tem de manter conduta irrepreensível na vida pública e privada. Está na Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman) e é do espírito da Carta que assim seja.
A reação aos expedientes regulamentares de controle da atividade judiciária (mesmo assim unicamente das instâncias inferiores, lamenta-se) é que tem sido absurdamente desproporcional. E é justamente essa desproporcionalidade que anda fazendo a sociedade acreditar que pretendemos ser melhores do que o resto de seus membros. Não somos. Temos responsabilidades muito graves, certamente, mas não somos melhores e nem piores do que ninguém que esteja além do nosso meio profissional e corporativo.
Além do mais, para quem não tem a quem apelar, a instituição de um órgão terciário para conhecer e decidir, do lado de fora das operações estritamente internas, sobre as mazelas do próprio sistema em que se atua com a mais absoluta lisura, não é apenas um alívio. É, sobretudo, uma necessidade institucional e ética. Afinal, não se pode julgar coisa alguma, resolver conflitos de interesse, ainda que internos, administrativos, sem considerar a equação garantista - tão cultivada noutros termos pelos opositores da ministra Calmon - que costumamos chamar de actio trium personarum.
A atuação de um órgão como o CNJ, ainda que muitíssimo incipiente, é a actio trium personarumpossível a tantos magistrados sérios, a dizer, independentes, que são vítimas e presas fáceis do sistema em que atuam. Ora o são por razões de emulação, outras vezes por vaidade. Outras, ainda, por inveja, e outras mais para acobertar ilícitos com os quais eles simplesmente não cooperam.
A sociedade não costuma tomar conhecimento dessas tragédias que acontecem no meio judicial tupiniquim. E menos ainda que, quando dificilmente encaminhados, esses casos costumam sofrer solene esquecimento ou contorcionismos hermenêuticos, os quais acabam gerando impunidade. Por trás de tudo isso reside um argumento de estabilização do sistema e de proteção da imagem da Justiça que pode ser sintetizado numa palavra: corporativismo.
O efeito desse modelo é que o magistrado honesto não se ocupa normalmente em expandir a própria honradez, acreditando que fazer a sua parte acaba sendo uma prática revolucionária. No geral, o pano de fundo comportamental diante desses cenários é o silêncio.
Porque quem ousa falar em demasiado e gerar suscetibilidades às vezes inteiramente despropositais, vai acabar sofrendo revezes e hostilidades em sua carreira, pelo menos. E se um independente é rotulado como tal, logo passa a sofrer ostracismo de parte dos próprios pares, receosos de prejudicar-se também.
Isso tudo acontece entre nós, não se pode negar, e os controles internos não têm sido capazes de dar cobro a nada disso. O circuito das cúpulas, que produzem política pública interna e possibilitam as movimentações funcionais (humanas, materiais e financeiras), é formidavelmente fechado e esses “clubes” costumam ser para poucos. De fato, corregedoria local não corrige desembargador e muito menos ministro de tribunal superior. Ora, devemos acreditar que essa clientela sobrepaira à lei? Absurdo. E esse é um dos vícios do sistema constitucional que nos rege, ou das interpretações que sobre a Constituição são internamente estabelecidas, em causa própria.
Os magistrados são, em geral, bem intencionados e merecem respeito, evidentemente. Nada obstante, não é disso que se fala. O questionamento central reside no fato de que a autopoiese do sistema judicial brasileiro está fragmentada, adoecida por uma contaminação histórica em que a estrutura de vasos comunicantes, ali compreendida institucionalmente, não funciona a contento em prejuízo dos altos interesses da nação.
Acontece que os magistrados, sobretudo os da base, justamente aqueles que prestam os mais fecundos serviços à população, pois estão na ponta da prestação jurisdicional, são quase inteiramente incapazes de dar enfrentamento aos maus procedimentos de conduta que vergastam, no âmbito do Poder Judiciário e não raro interferem na formulação de nossas políticas e nas escolhas na carreira.
Sobre o mais, quantos juízes não nos sentimos injustiçados - e com razão - por causa desse fenômeno atávico com o qual temos tido a infelicidade de conviver, à falta de um regimento de controle eficaz para evitar que tudo isso aconteça? Desse modo, quem não é a favor do que se passa em nosso meio, e é censurável, não pode ser contra. Segue o seu calvário silencioso por medo da própria liberdade, ou por instinto de sobrevivência profissional. Afinal, não é justo cogitar que abraçar uma carreira seja sinônimo de estagnação.
A messe é grande e muitos desafios estão a nos aguardar a todos os magistrados do país, pois seremos chamados, indeclinavelmente, a abastecer o processo de transformação social e de aproximação com o povo a que estamos fadados pela história.
Finalmente, pode-se afirmar que a receita para uma magistratura de fato republicana no Brasil é simples de ser obtida e passa pela superação de mecanismos que, embora insertos da Constituição Cidadã, são de natureza nitidamente autoritários. Vamos aos ingredientes:
1) varrer as cúpulas de seus “cercadinhos”, trocando todo o pessoal tradicional que lá presentemente se encontra ainda vinculados ao passado; 2) eliminar a possibilidade de gestão por parte dos Magistrados, pois Juiz julga e não deve administratrar Tribunais e orçamentos públicos; 3) desconstruir o afilhadismo e o clientelismo, em parte corolário da retirada dos poderes de gestão dos Juízes, dos quadros judiciários; 4) desconstruir o farisaico critério de merecimento, porque ele serve mais à lógica das boas relações (conforme o ensinamento de Sergio Buarque de Holanda em Raízes do Brasil) do que, propriamente, à captura dos melhores, quase sempre preteridos em favor dos áulicos das cortes (alguns chegam a dizer, sem cerimônia, que elas são para ser “cortejadas”); 5) estabelecer o efetivo Controle Externo como sendo o resultado das funções de um organismo composto diretamente pelos representantes eleitos da população (sendo ou não gestores os Magistrados); 6) eleição geral para Ministro do STF, ou profissionalização do acesso à Suprema Corte e aos demais Tribunais Superiores.
Há outros ingredientes, mas o simples rearranjo da carreira, atual moeda de troca para promoções e outras vantagens funcionais, para possibilitar que ela realmente se profissionalize, muda, de pronto, o perfil do Poder Judiciário brasileiro. A “moeda”, enfim, desaparece. E um novo padrão de relacionamento institucional há de ser estabelecido com vantagens para o espírito republicano.
Todavia, quem vai mexer em casa de marimbondo? O leitor sabe quantos poderosos estão interessados em mudar esse circuito público inteiramente facilitador das manigâncias sociais acumuladas ao longo do tempo? Arrisco que se pode contar nos dedos. De todo modo, vale manter a esperança de um novo tempo de mais felicidade e menos sofrimento para todos. O povo, de tão sofrido e enganado, um dia acorda e deixa de tentar ser esperto também.
Roberto Wanderley Nogueira é juiz Federal em Recife, doutor em Direito Público e professor-adjunto Faculdade de Direito do Recife e da Universidade Católica de Pernambuco.
Revista Consultor Jurídico, 26 de dezembro de 2011

Consumidor será indenizado por defeito de trator zero quilômetro



Produtor rural que comprou trator zero quilômetro que apresentou defeito 12 dias após a aquisição conquistou na justiça o direito à indenização. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul confirmou a sentença do Juízo de Cachoeira do Sul e manteve a condenação da empresa Avanti Sistemas Mecanizados Ltda. ao ressarcimento do valor do veículo e ao pagamento de indenização por danos morais ao consumidor.
Caso
Segundo o autor da ação, o trator começou a apresentar problemas mecânicos menos de duas semanas após a compra. Os defeitos foram constatados e não resolvidos pela concessionária. Mencionou que todas as tentativas de solução dos problemas foram inexitosas, sendo que os defeitos foram se agravando com o decurso do tempo. Ele afirmou ainda que os problemas com a máquina resultaram em prejuízos, pois restringiram a eficiência de suas lavouras.

Na Justiça, o autor ingressou com pedido de danos morais e materiais.

Sentença
Na Comarca de Cachoeira do Sul, o processo foi julgado pela Juíza de Direito da 2ª Vara Cível do Foro, Lilian Astrid Ritter. Segundo a magistrada, o autor comprovou que encaminhou seu trator à empresa ré por várias vezes, poucos dias após a compra do bem, em função de problemas de ordem mecânica.
A empresa Avanti Sistemas Mecanizados Ltda foi condenada ao pagamento de indenização por danos morais ao autor da ação no valor de R$ 5 mil. Também foi condenada a restituir o valor pago pelo trator, cerca de R$ 60 mil, com correção pelo IGPM e juros de mora.
Houve recurso da decisão por parte da empresa.

Apelação
O recurso foi apreciado pela 10ª Câmara Cível do TJ/RS. O Desembargador relator Paulo Roberto Lessa Franz confirmou a sentença do Juízo do 1º Grau.
Segundo o magistrado, a frustração decorrente da aquisição de veículo defeituoso, aliada à dificuldade em ter o problema solucionado diretamente com as fornecedoras, os transtornos e a privação a que se submeteu o autor é uma situação suscetível a ensejar o dano moral.
A situação, por evidente, retira o consumidor de seu equilíbrio emocional, pelo fato de o produto adquirido não oferecer a qualidade e confiança legitimamente esperadas, afirmou o Desembargador.
Também participaram do julgamento os Desembargadores Jorge Alberto Schreiner Pestana e Túlio Martins, que acompanharam o voto do relator.
Apelação nº 70045570603
Autor: Rafaela Souza

Italiano de 99 anos pede divórcio por caso de esposa nos anos 40

Antonio C. descobriu cartas de amor em gaveteiro antigo e esposa confessou ter tido um amante há mais de 60 anos.

30 de dezembro de 2011 | 9h 18

Um italiano de 99 anos decidiu se divorciar de sua mulher após 77 anos de casamento depois de descobrir que ela teve um caso secreto nos anos 1940.
Segundo jornais italianos, Antonio C. descobriu a traição em 2002, ao encontrar cartas de amor escondidas em um gaveteiro antigo.
Confrontada pelo marido na ocasião, Rosa C., de 96 anos, confessou ter escrito as cartas a um amante havia mais de 60 anos.
Desde então, o casamento passou por sérias provações, com constantes ataques de ciúmes e ressentimento de Antonio, que, quase dez anos depois de descobrir a traição e apesar dos apelos da mulher, resolveu dar entrada nos papéis do divórcio.
O casal se conheceu nos anos 30 em Nápoles, onde Antonio era policial. Eles se casaram em 1934, tiveram cinco filhos e têm mais de uma dezena de netos.
Segundo o jornal britânico Daily Telegraph, acredita-se que o caso marque um novo recorde, pelo menos no que concerne a idade de Antonio - ele passa ser o homem mais velho a entrar com processo de divórcio.
Até então, o casal mais idoso a se separar oficialmente era formado pelos britânicos Beartie e Jessie Wood, quando ambos estavam com 98 anos. BBC Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito da BBC. 

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

"Judiciário não precisa de mais juízes, e sim de gestão"

Ainda nos tempos do curso de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Luciana Gross Cunha percebeu que sua vocação estava longe das sustentações orais dos advogados e próxima da pesquisa sobre o universo jurídico. Na mesma época, começou a cursar Ciências Sociais na Universidade de São Paulo. Lá ficou. Saiu primeiro mestre, em 2000, e depois doutora em Ciência Política, em 2004. Ainda assim, a hoje professora da Direito GV não abandonou de vez o Judiciário.

Com a defesa da dissertação Acesso à Justiça e Assistência Jurídica em São Paulo e, quatro anos depois, da tese Juizado Especial: Criação, Instalação e Funcionamento e a Democratização do Acesso à Justiça, firmou-se no cenário acadêmico, em especial nos estudos voltados à administração da Justiça. “Nunca cheguei a advogar. Tenho o meu número da OAB, mas ele é inativo. Acho que desde a faculdade eu já meio que sabia disso”, conta.
Em conversa com a Consultor Jurídico, Luciana conta que o que move suas pesquisas é olhar sempre o Judiciário em questão de eficiência e de gestão na Justiça, “sempre procurando um olhar que não se confundisse muito com o olhar tradicional do Direito”. No caso, olhar o fenômeno a partir da Ciência Política.
Coordenadora do programa de mestrado da Direito GV, Luciana acredita que a maior parte das escolas de Direito vem repetindo as velhas fórmulas. Como resultado, forma advogados especializados em litigar — o que contribui para o entupimento do Judiciário. “É um alto custo propor um modelo de educação jurídica diferente”, acredita.
A professora comentou a repercussão geral, que acredita não ser bem empregada. “Os ministros pegam os casos fáceis e onde não há controvérsia. Os casos que vêm sendo decididos por meio de repercussão geral não fazem muita diferença”, explica. Ao falar sobre os problemas do Judiciário, ela disse que “não é um problema processual, nem um problema de reforma do processo. Até temos alguns problemas processuais, mas eles são muito pontuais e as reformas que estão vindo, como a reforma da Lei da Ação Civil Pública e a reforma do Código de Processo Civil não vão resolver o sistema. A questão da gestão engloba tratar o Judiciário como um prestador de serviço público”.
Ao longo da entrevista, passou por diversos temas, como a greve do Judiciário Federal, que se desenrola desde 17 de outubro. Para ela, ocorre um jogo de empurra por parte do Legislativo de suas responsabilidades para o Judiciário. Ela assume o papel do parlamentar e solta o argumento mais empregado: “A culpa não é nossa, a culpa é da Presidente que não quer dar o aumento, porque olha, a gente aprovou a lei. Então, é um jogo que o próprio Legislativo dá as cartas”.
Leia a entrevista:
ConJur — Muita gente fala que o problema do Judiciário está na gestão. A senhora concorda com isso? Que reformas são necessárias?
Luciana Gross Cunha — Concordo. Não é um problema processual, nem um problema de reforma do processo. Até temos alguns problemas processuais, mas eles são muito pontuais e as reformas que estão vindo, como a reforma da Lei da Ação Civil Pública e a reforma do Código de Processo Civil, não vão resolver o sistema. A questão da gestão engloba tratar o Judiciário como um prestador de serviço público. É preciso definir critérios de qualidade. As metas definidas pelo Conselho Nacional de Justiça já são uma conquista, mas elas sozinhas não mudam. Essa é minha implicância com a questão da PEC do Peluso.

ConJur — Por quê?
Luciana Gross Cunha — Sinto muito, mas eu não sei onde, não sei qual é o indício de que uma vez aprovada a PEC, isso vai melhorar o tempo do processo. A proposta elimina uma parte que não é uma parte considerável, como, por exemplo, os Habeas Corpus. Desafoga o Supremo Tribunal Federal, mas o problema de demora do Judiciário como um todo não resolve. Pensando de uma forma mais ampla. Quando se fala em problema de gestão no Judiciário, eles tocam em três pontos: pouco dinheiro, não tem computador e não tem juízes. Nenhuma dessas três coisas vai resolver o problema do Judiciário. Quando se fala em informatização, se fala na troca do papel por uma planilha do Excel. Não se fala em integrar, por exemplo, Polícia Civil, Ministério Público e Poder Judiciário, ou Poder Judiciário e Ministério Público, ou primeira e segunda instância e Tribunais Superiores. A informatização não passa por essa discussão. Em termos de número de juiz por processo e por habitante, estamos um pouco defasados em relação aos outros países, mas temos grandes diferenças nacionais. Não é o número de juízes que vai melhorar o quadro. Se aumentar o número de juízes, pode resolver o problema para o próximo biênio, mas daqui a quatro anos a gente vai ter esse problema de novo.

ConJur — Depois tem a questão do dinheiro...
Luciana Gross Cunha — É mentira que falta orçamento. Comparativamente, nosso Judiciário é caríssimo e é o único do mundo que tem previsão orçamentária em lei. Ainda que o Legislativo e o Executivo tenham de aprovar esse orçamento, o espaço de negociação é muito pequeno, porque se tem um teto de 6% do PIB estadual. Para os Judiciários estaduais isso é muito dinheiro. O Judiciário de São Paulo tinha, em 2004, 58 mil servidores. Não é possível você gerenciar tudo isso se não tem plano de carreira, os salários são super baixos, você não tem nenhum estímulo e nenhuma gratificação. É onde a burocracia impera e emperra. De um lado há carreiras que precisam ser valorizadas e profissionalizadas e, de outro lado, tem a questão da logística. Não existe plano de logística dos tribunais. Nos Estados Unidos, a gente tem uma técnica de gerenciamento do processo pelo juiz. Ele tem uma equipe de assessores que são profissionais, remunerados e reconhecidos. Normalmente são jovens, bacharéis em Direito, que passam pelos tribunais, até para poder ter experiência jurídica, mas são cobrados. Enfim, é um trabalho meritocrático. Quando se fala em problema, em crise no Judiciário, não são reformas constitucionais que resolvem, nem reformas processuais. É choque de gestão. E é choque de gestão pública. O Judiciário ainda não percebeu que não dá para voltar atrás e ficar com o discurso de que não é prestador de serviço porque é um poder do Estado.

ConJur — Como conter a demanda que não para de crescer?
Luciana Gross Cunha — Essa é outra questão: nosso modelo de solução de conflito. A gente tem um modelo, que é o modelo tipicamente, vamos dizer assim, é um modelo republicano francês em termos de sistema Judiciário. O Judiciário é o único que detém o monopólio de solução de conflito no Estado. Isso faz com que, cada vez mais, eu tenha um maior número de processos sendo levados para o Judiciário porque não há nenhuma alternativa. Por isso existe um crescimento exponencial do número de processos. A sociedade vai ficando mais complexa, acontecem mais conflitos, só que só existe uma esfera para solucioná-los. Então, tem decisão do Cade [Conselho Administrativo de Defesa Econômica] indo parar no Judiciário que tem de rever a decisão tomada por uma agência regulatória. O Judiciário vai ver se foi seguido o devido processo legal, mas não dá para exigir que este princípio seja aplicado da mesma forma em todas as esferas de solução.

ConJur — O incentivo à conciliação diminui o número de ações que entram no Judiciário ou cria uma demanda que hoje está reprimida, por exemplo, como aconteceu nos Juizados Especiais?
Luciana Gross Cunha — Existem duas questões em torno da conciliação. Uma é como é que essa conciliação está sendo feita. A forma pela qual o Conselho Nacional de Justiça estimula essa conciliação, durante a semana da conciliação, é um problema, porque é o Judiciário fazendo conciliação e este não é papel dele. Esse é o papel do advogado, mas não do juiz. Ele é vítima desse sistema criado pelas escolas da magistratura e não tem como sair desse círculo vicioso de impor a conciliação. É uma falha do sistema como um todo. O caminho não é esse. Também não acho que isso tenha a ver com demanda reprimida. Quer dizer, o discurso que é feito e que foi feito com o Judiciário, com o Juizado Especial, era um discurso errado. Estudos preliminares mostram que no interior de São Paulo, você tem uma vara que é uma vara geral que atende todos os processos. Quando você especializa essa vara, criando, por exemplo, uma vara de Direito da Família, não há uma diminuição dos processo dessa vara judicial. O que acontece é o estímulo à entrada de processo, que passa a ser feita também na Vara de Família. Daí, porque o Juizado Especial não vinha resolvendo problemas da Justiça Comum, mas ele vinha estimular o reconhecimento do Judiciário como um monopólio de solução de conflito. Só que agora é uma porta diferente. A minha crítica é que hoje em dia ela já não é mais diferente do resto porque os processos demoram, você tem obrigação da presença do advogado, você importou o sistema da justiça normal, da justiça comum, para os Juizados Especiais. Os Juizados Especiais, hoje em dia, têm os mesmos problemas da justiça comum. Se começarmos a pensar na conciliação nesse formato dentro do próprio Judiciário, estaremos fazendo isso de novo. Temos que estimular a conciliação, mas é via advogado. É o advogado o grande agente dessa conciliação.

ConJur — Então o foco é outro?
Luciana Gross Cunha — É um paradoxo, porque o cliente quer ir ao Judiciário. Em uma reunião com a ministra Cármen Lúcia, ela contou que logo que começou a advogar, em Minas Gerais, ela atendeu uma pessoa e ela disse assim: “Olha, não vale a pena entrar no Judiciário.” O cliente virou e respondeu: “Mas, espera um pouco, você é advogada ou não? Você não está entendendo, eu quero entrar e por isso que eu vim aqui. Eu não quero me aconselhar, eu quero entrar no Judiciário.” É uma questão cultural.

ConJur — O Juizado Especial hoje tem problema na execução também, assim como a Justiça Comum?
Luciana Gross Cunha — A execução continua sendo um problema de todos. É aí que vem a questão sobre judicializar ou não. Não posso pensar em judicializar sem pensar na execução. Você vai entrar contra esse fulano na Justiça, mas ele não tem bens, o que você quer dele? Na verdade, muitas vezes se quer a vingança, e a forma de fazer vingança na modernidade, qual é? É tendo um mandado judicial. A Ação Civil Pública, por exemplo, foi um ganho e uma conquista enorme. Mas como eu executo uma decisão de Ação Civil Pública? O processo de execução dela é individual. O Judiciário individualiza muito as decisões e as ações. É muito difícil ter uma Ação Civil Pública procedente porque o juiz sabe que isso vai dar problema lá na frente. Quem vai ser o juiz que vai querer executar aquela sentença? Então, a execução é um problema, mas no Juizado Especial, o maior problema é a importação de procedimento da Justiça comum. Criaram-se critérios que obrigam a presença do advogado e com um ponto mais negativo ainda, que é, ao menos em São Paulo, a inexistência de juiz titular de Vara de Juizado Especial. O que isso quer dizer? Os juízes passeiam pelos juizados, mas eles não querem ficar lá. Criou-se também sistema recursal para o STJ, a quem cabe uniformizar as decisões dos colégios recursais dos Juizados Especiais. Está sendo levada para o STJ uma decisão  lá de baixo, de compra de caneta BIC.

ConJur — Na PEC do Peluso, suponhamos que você comece a executar uma sentença e depois descubra que houve um erro ou que não era bem aquilo. Isso não é perigoso para a segurança jurídica?
Luciana Gross Cunha — Advogados penalistas dizem que vão fazer de tudo para que o cliente deles não entre nesse sistema carcerário que a gente tem hoje no Brasil, que é ingovernável e intenso. Entra aí uma questão de também olhar o sistema de Justiça de uma forma mais ampla, mas os juristas não gostam de fazer isso. Não gostam nem de tratar de Polícia Civil, que é parte de sistema de Justiça, nem tratar de política carcerária, que também faz parte do sistema de Justiça. Temos de pensar o modelo que construímos, que não é um modelo processual, mas sim institucional. Com a Reforma do Judiciário de 2004 [Emenda Constitucional 45], o STJ e o STF passaram a ser efetivamente a cúpula do Poder Judiciário. Ali aconteceu efetivamente um processo de centralização do tomador de decisões. Agora, por uma lei processual, por uma discussão de processo constitucional, eles querem fazer com que se restrinja o número de esferas revisoras. O argumento do ministro Peluso é que não existem, ou existem muito poucos erros judiciários. Só que espera um pouquinho: um erro do Judiciário não é um erro qualquer.

ConJur — E se esse erro for penal?
Luciana Gross Cunha — Se for penal é mais complicado ainda. E aí qual é o poder que os próprios tribunais têm de rever e tomar decisões efetivas nesse sentido? Temos de pensar se a PEC do Peluso, e é isso que eu acho que não vai acontecer, descentraliza o sistema. O Supremo Tribunal Federal, principalmente por conta da Súmula Vinculante e da Repercussão Geral, ainda concentra. Eles estão falando que isso diminui o tempo. Mas vai diminuir o tempo em detrimento da certeza do Direito? Não acho que seja em relação à segurança jurídica, e sim em relação a essa certeza, porque se formos pensar em termos federativos, é bom que o Rio de Janeiro tome uma decisão que é diferente do estado de São Paulo. Existem estados em que questão do devido processo legal, da segurança, do papel do advogado são mais urgentes do que em outros. Quero ser convencida, mas os argumentos que me mostram ou que me apontam a favor da PEC do Peluso, não me convencem de que isso vai aumentar a segurança jurídica, diminuir o tempo do processo, garantir uma efetividade da Justiça em termos de impunidade. De novo: o problema não está aí. Parece mais, como ele é o presidente do Supremo Tribunal Federal, que ele tem que ter uma política. Ele não tem política para o CNJ porque ele é contrário ao papel do CNJ na intervenção das corregedorias e nos processos disciplinares nos tribunais estaduais. O grande projeto do Gilmar Mendes estava no CNJ. Então, ele tem que ter um projeto, quase como um político. E qual o projeto dele? É a PEC do Peluso. Até porque isso vai reduzir um pedaço dos processos que chegam até lá que é muito pequeno dentro do número total de processos do Supremo Tribunal Federal.

ConJur — O STF tem um papel político?
Luciana Gross Cunha — Tem. Não só o STF, mas o Judiciário inteiro. E isso é culpa da Constituição. Está na origem do nosso modelo de Judiciário, que tem inspiração norte-americana. O Judiciário é um poder político desde sempre porque ele faz o controle constitucional.

ConJur — Isso chega a ser negativo?
Luciana Gross Cunha — Não, não acho que seja negativo. Óbvio que tem uma discussão sobre legitimidade e sobre a qualidade do resultado dessa decisão. É preciso deixar claro duas coisas. Um, a legitimidade do Poder Judiciário é diferente da legitimidade do Executivo e do Legislativo, mas é democrática. A democracia prevê diversas formas de legitimidade. Uma delas é a representação por meio de partidos políticos, da eleição para preenchimento de cargos no Executivo e no Legislativo e a outra é uma legitimidade que se dá via Constituição. Então, é a Constituição Federal que dá legitimidade ao Poder Judiciário de fazer o controle da constitucionalidade, certo? Portanto, ele é um poder político e cabe a ele interferir. Agora, podemos fazer um estudo para analisar se o Judiciário, no exercício desta função política, vem produzindo bens públicos e se vem atendendo a interesses públicos ou não. Não é uma legitimidade que vem da eleição. Por isso o Judiciário tem controles e constrangimentos processuais. No Legislativo e no Executivo, qual controle é feito? Via eleição. É via sistema partidário, que controla os representantes do povo. No Judiciário, os controles se dão por meio dos princípios processuais. Podemos questionar a qualidade desse constrangimento, mas dizer que isso é ilegítimo e que ele é incompetente em termos de competência constitucional não faz nenhum sentido. Esse é o dilema da democracia e do Estado democrático de Direito. Pode ter conteúdos que eu não concordo, agora por que eu aceito? Porque o procedimento é legítimo. Política tem uma conotação negativa e pra mim isso tem relação com a forma como os juristas traduziram Montesquieu dentro da tradição jurídica brasileira. Tem um erro de tradução. Montesquieu fala em juiz boca da lei? Fala, mas ele só fala isso porque antes ele decide a separação de poderes de outro jeito. Ele não decide a separação de poderes pela função. Ele fala assim: “Os três poderes têm a mesma função, que é a de dirimir conflitos. O que diferencia um do outro é o objeto desse conflito. Então, o Executivo decide, soluciona conflito envolvendo o que ele chama de “direito das gentes”, que é o Direito Internacional. O Legislativo decide conflitos que envolvem a relação entre o Estado e governados. E o Judiciário decide conflitos que envolvem os particulares. Como o Judiciário é o poder político, ele é a boca da lei. Mas ele não está dizendo que não é poder político, ele não está dizendo que não existem regras de interpretação.

ConJur — Professora, vamos falar sobre a forma de indicação dos ministros para o Supremo? A ministra Rosa Maria agora acabou de sair do Tribunal Superior do Trabalho e reconheceu que não tem um conhecimento plural do Direito pelo fato de ter ficado muito tempo lá. Isso é bom?
Luciana Gross Cunha — Pois é, estamos em um momento que precisamos discutir isso. Não acho que devemos abandonar este modelo de indicação política. O problema não está aí porque o STF é, de fato, um órgão político. É o mais político dos órgãos do Judiciário porque a função dele mais importante é a interpretação constitucional ou deveria ser a principal função dele. Agora, precisamos discutir como se dá esse procedimento. Assisti a um pedaço da sabatina do Senado e acho que essa sabatina é diferente das outras.

ConJur — Você diz a sabatina da ministra Rosa Maria?
Luciana Gross Cunha — Da Rosa Maria. Em primeiro lugar, foram muitos votos contrários. E, segundo, foram feitas perguntas muito substanciais. Óbvio que isso não aconteceu porque os senadores melhoraram a sua qualidade de argumentação, mas sim porque essa ministra vai chegar para decidir questões cruciais. A principal delas é o mensalão. Agora, se essa é uma escolha política, por que isso não é discutido pela mídia? Por que não se fala quem são os candidatos? Por que a vida deles não é exposta como acontece nas eleições para o cargo de governador e de prefeito, por exemplo? Acho que aí existe um certo silêncio da sociedade. O Tribunal Superior do Trabalho é capaz de produzir ministros para o Supremo Tribunal Federal. Isso não é um problema. Eu acho que pode até ser um ganho em termos de discussão de conteúdo das decisões. A Justiça do Trabalho é uma Justiça pouco estudada. Mas ela falhou quando não quis assumir nenhuma posição na sabatina porque ela não conhece o assunto. O STF não é lugar para se aprender. Caso eu fosse ré em processo ou autor em um processo, não gostaria que ela aprendesse com o meu processo, certo? Só quero que ela julgue o meu processo depois que ela tiver aprendido.

ConJur — É a mesma história de ser operado por um médico que está fazendo aquele tipo de cirurgia pela primeira vez?
Luciana Gross Cunha — Mas o médico residente tem um supervisor. No STF não tem supervisão, então acho que a gente tem um problema aí que é um problema: o que os presidentes estão considerando notório saber jurídico. Acho um problema essa questão da blindagem dos candidatos. Quem eram os outros? Por que os outros não foram escolhidos? Por que ela foi a escolhida em detrimento de outros? Parece que ficou um pouco claro que a presidente Dilma queria nomear uma mulher. Está bom, mas era só essa candidata? Tinha outras? Por que não foram as outras? Foi por que as outras não quiseram? Esse tipo de informação é uma informação democrática. Precisamos saber. É um processo democrático, mas ele acaba sendo quase que uma indicação de ministro de Estado, que cabe exclusivamente ao presidente da República. Uma vez que o ministro assume uma função pública, a vida privada dele, diferente do que a presidente Dilma pensa, é pública também.

ConJur — E esses ministros são influenciáveis pelo presidente que o indica?
Luciana Gross Cunha — Não acho que eles sejam absolutamente influenciáveis no conteúdo das suas decisões pelo presidente que o indica. Existem estudos que mostram que o fato de o Lula ter indicado determinados ministros não faz com que esses ministros votem a favor das políticas públicas ou das políticas do Executivo Federal. O STF sabe lidar com isso melhor do que o resto do Judiciário. Não por acaso ele faz, hoje em dia, audiência pública dentro do próprio STF. Mas se ele sabe lidar com essa questão política por que não lidar desde o começo no momento de indicação?

ConJur — O Supremo vem ganhando mais força na vida das pessoas. Dá pra perceber que assuntos bem importantes são levados até ele. Como a senhora avalia o papel do STF hoje?
Luciana Gross Cunha — Isso é natural e normal — não vejo como uma patologia da democracia brasileira, porque, como eu já disse, o Judiciário é um poder político e o STF é o mais político de seus órgãos. Agora, existem duas questões que precisam ser olhadas com cuidado. Quando o Legislativo entra nessa dança é um problema. O primeiro caso que me chamou a atenção foi a votação da CPMF. A oposição, o Tasso Jereissati, subiu à tribuna do plenário do Senado e falou assim: “Se vocês aprovarem a continuidade da CPMF, a ADI [Ação Direta de Inconstitucionalidade] no Supremo já está pronta”. Quer dizer, é o Legislativo dançando conforme a música tocada pelo STF. Ele fala assim: “Não, essa decisão aqui eu não sou capaz de criar consenso e de produzir decisão dentro do Legislativo. Então, eu passo isso para o STF".

ConJur — Por que isso não acontece no Legislativo?
Luciana Gross Cunha — Existem argumentos fracos: porque o Legislativo é menos representativo, ou porque existe crise política, ou porque tem corrupção. Acho que é muito mais porque o Legislativo aprendeu que é mais fácil transferir a responsabilidade para a tomada de certas decisões para o Supremo do que assumir essa responsabilidade. Foi exatamente o que aconteceu com a Lei da Ficha Limpa. Todo mundo falava: “Tem um questionamento importante sobre a constitucionalidade dessa lei, mas era aberto para jurisdição, tinha clamor público, tinha questão de que era uma iniciativa popular...”. O que o Congresso Nacional fez? Aprovou. O que o presidente fez? Sancionou e pensou assim: “Deixa o Supremo resolver isso”. Ou seja, ele transfere o ônus negativo para o Supremo e como os ministros não são eleitos, o Supremo cuida disso. É a mesma coisa que acontece agora com a reforma política. Por que quem está fazendo a reforma é o Tribunal Superior Eleitoral e o Supremo Tribunal Federal? Porque o custo dessa reforma política no Congresso Nacional é muito alto para os deputados. Eles transferem a responsabilidade e essa e é uma transferência consciente. O Legislativo percebeu que manipula a responsabilidade política. É um jogo. Apesar de parecer que o Executivo controla a pauta e o jogo do presidencialismo de coalizão, quem comanda é o Legislativo.

ConJur — Professora, fale, por favor, sobre as pesquisas que tem em andamento?
Luciana Gross Cunha — Temos três pesquisas importantes em andamento. A principal pesquisa é o "Índice de Confiança na Justiça Brasileira", que mede trimestralmente a percepção da população com relação ao funcionamento do Poder Judiciário e da Justiça como um todo. É uma pesquisa que está em campo desde 2009. São publicados quatro relatórios por ano. É feita em sete estados do Brasil: São Paulo, Rio, Rio Grande do Sul, Minas, Pernambuco, Bahia e Distrito Federal. Olhamos aí, não só a avaliação do Judiciário como prestador de serviço, mas também como é que a população se comporta frente ao Judiciário. Ou seja: qual é a disposição das pessoas de acionar o Judiciário para resolver seus conflitos no dia a dia? O próximo relatório sai em fevereiro do ano que vem, referente ao quarto trimestre de 2011. É um projeto grande, a longo prazo.

ConJur — A segunda, qual é?
Luciana Gross Cunha — Tem a pesquisa "STF e o sistema político brasileiro", feita no Núcleo de Constituição e Justiça, que é coordenado por mim e pelo professor Dimitri Dimoulis. Estamos olhando o Supremo Tribunal Federal e seus padrões de decisão durante dois anos, de 2007 a 2009.  Esse período coincide com o tempo em que Carlos Alberto Menezes Direito foi ministro do STF e não comporta nenhuma alteração no plenário. E aí, a gente está olhando todas as decisões no plenário para ver qual é o padrão de decisão. É um projeto em conjunto com os alunos do mestrado. Estamos montando um banco de dados que provavelmente estará pronto em fevereiro do ano que vem, também.

ConJur — E a teceira?
Luciana Gross Cunha — É um projeto capitaneado pela Law School, em Harvard, que analisa a globalização da advocacia nas economias emergentes. Estamos de olho no Brasil, na China e na Índia. Analisamos a educação jurídica, a regulação do ambiente profissional, o papel das entidades reguladoras e os grandes escritórios de advocacia, como esses escritórios estão organizados, como se comporta a elite jurídica, se essa elite jurídica tem diferença com os juristas tradicionais ou não, qual é a diferença que existe e como os departamentos das grandes empresas se estruturam em termos jurídicos. Aqui no Brasil existe uma tendência, que nos Estados já é realidade, de os departamentos jurídicos das grandes empresas serem um grande atrativo para os novos advogados, que estão no momento inclusive de virarem sócios de grandes escritórios, mas preferem ir para as empresas. É o surgimento de uma nova arena de atuação forte do advogado, com salários muito competitivos com grandes escritórios.

ConJur — E por que isso acontece?
Luciana Gross Cunha — O primeiro fenômeno que verificamos é o peso da globalização. Essas mpresas têm negócios no exterior e elas negociam, elas atuam, por exemplo, em câmaras internacionais de arbitragem, e o negócio dos grandes escritórios passou a ser muito competitivo. Então, vale mais a pena você ter um grande advogado entre os seus funcionários. Esse grande advogado aparece com status diante dos colaboradores, com papéis fundamentais. Então, de um lado você tem a globalização e do outro você uma maior profissionalização dos escritórios. Os escritórios deixaram de ser familiares. Essa é uma tendência percebida desde a década de 1990. Os nossos cursos de Direito não ensinam ao estudante de Direito a habilidade para lidar com esses clientes. Assim, as empresas passam a ser um grande atrativo porque nela não é preciso lidar com o cliente. A instituição é o seu próprio cliente: você tem que brigar pelos interesses dela. Também existe a percepção de que nas empresas você teria uma qualidade de vida melhor do que nos grandes escritórios. Tem uma questão também pessoal e individual em termos de vida profissional. Os departamentos jurídicos começam a ser competitivos em termos de salários, mas eles têm uma maior atratividade exatamente porque eles garantem uma qualidade de vida melhor para esses advogados.

ConJur — Os números do Índice de Confiança na Justiça Brasileira são bons? Como é a confiança da população?
Luciana Gross Cunha — Os números são ruins, mas eu já fui mais pessimista. Hoje em dia, apesar da avaliação ser ruim, temos que começar a criar critérios. Ou seja, fazer a pesquisa e acompanhar esses números de uma forma sistemática e dentro de um grande espaço temporal. Uma informação essencial é olhar a eficiência da instituição e se a ela está fazendo ou não diferença. Estamos em um momento no qual precisamos começar a interpretar esses números no seguinte sentido: não só no que eles valem efetivamente para o funcionamento do Judiciário, mas também como o Judiciário vem trabalhando com essa percepção no sentido de mudar a gestão da justiça. A grande novidade nesse cenário é o Conselho Nacional de Justiça e o papel da Corregedoria. Nesse semestre o debate que aconteceu em torno da Eliana Calmon, em termos de atuação da Corregedoria nos casos envolvendo corrupção no Judiciário de uma forma geral, é absolutamente saudável, necessário e mostra os pontos de resistência e facilidade que o CNJ tem em lidar com essa questão sobre o Judiciário, que é uma questão estranha ao Judiciário, diferente do que acontece no Legislativo e no Executivo.

ConJur — Por que é diferente?
Luciana Gross Cunha — A Lei de Improbidade Administrativa é de 1992, mas os juízes não respondem por ela. Eles continuam respondendo pela Lei Orgânica da Magistratura. Esse padrão tem que mudar. As demandas da democracia não aceitam mais que isso seja assim. O Judiciário é um poder que foi tão exposto a partir de 1988, mas que não precisa prestar contas do que faz? O serviço tem que ser eficiente, transparente, com baixo custo, produzindo um resultado satisfatório. De outro lado, tem o papel do Judiciário como resistência à defesa dos Direitos, no sentido de que ele é um poder do Estado, no qual você pode reivindicar direitos de uma forma direta. Apesar das pessoas criticarem e terem uma visão negativa do Judiciário, elas querem esse Poder.

ConJur — Então é uma relação de amor e ódio?
Luciana Gross Cunha — É. Tem um paradoxo aí. Os dados estão mostrando que isso não é mais uma sensação ou um achismo dos pesquisadores ou dos juristas. Isso é real. A pesquisa mostra isso efetivamente.
Marília Scriboni é repórter da revista Consultor Jurídico.
Revista Consultor Jurídico, 25 de dezembro de 2011