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terça-feira, 8 de março de 2011

Compensação do crédito tributário e preclusão judicial

Ver autoresPOR GUILHERME CEZAROTI
Muitos contribuintes ingressam com medidas judiciais contra a União Federal em litisconsórcio ativo, quando a relação jurídica contestada, sob alegação de ilegalidade ou inconstitucionalidade, é idêntica, de modo que se espera que a decisão final seja igual para todos.
No entanto, por diversas razões, um contribuinte, satisfeito com a decisão favorável proferida pelo tribunal de segunda instância, deixa de interpor o recurso especial ou extraordinário, enquanto outro o faz[1].
A decisão do tribunal de segunda instância, para este contribuinte que não interpôs nenhum recurso, torna-se imutável por força da preclusão temporal, mas ainda não foi alcançado pela coisa julgada material.
Nesta situação, cabe analisar se o contribuinte que não recorreu pode compensar os seus créditos decorrentes da decisão judicial favorável, em decorrência da coisa julgada formal.

O momento da ocorrência do trânsito em julgado
O trânsito em julgado torna definitiva a decisão tomada pelo juiz, que reconhece a ilegalidade ou inconstitucionalidade do tributo e, consequentemente, a inexistência da relação jurídica tributária, traduzindo-se na existência de créditos a serem recuperados pelo contribuinte.

Uma decisão só é definitiva quando não está sujeita a mais nenhum tipo de recurso, seja porque os existentes foram esgotados (coisa julgada material) ou porque houve o decurso de prazo para o seu exercício (coisa julgada formal).
Regra geral, os cartórios certificam somente a ocorrência da coisa julgada material, ao final do processo, mas não costumam fazê-lo quando da coisa julgada formal para apenas um dos litisconsortes.
Isso não impede, no entanto, que o litisconsorte comprove, mediante cópia dos autos, que somente ele não interpôs qualquer recurso, razão pela qual a última decisão proferida é, para ele, definitiva.
Não se desconhece a existência de precedentes do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que a coisa julgada ocorre somente a partir do trânsito em julgado da última decisão proferida no feito, em relação a todos os legitimados e a todos os pedidos, com a superação da tese do “trânsito em julgado parcial” ou “trânsito em julgado por capítulos”,in verbis:
“PROCESSUAL CIVIL - EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL - AÇÃO RESCISÓRIA - PRAZO PARA PROPOSITURA - TERMO INICIAL - TRÂNSITO EM JULGADO DA ÚLTIMA DECISÃO PROFERIDA NOS AUTOS - CPC, ARTS. 162, 163, 267, 269 E 495.
- A coisa julgada material é a qualidade conferida por lei à sentença /acórdão que resolve todas as questões suscitadas pondo fim ao processo, extinguindo, pois, a lide.
- Sendo a ação una e indivisível, não há que se falar em fracionamento da sentença/acórdão, o que afasta a possibilidade do seu trânsito em julgado parcial.
- Consoante o disposto no art. 495 do CPC, o direito de propor a ação rescisória se extingue após o decurso de dois anos contados do trânsito em julgado da última decisão proferida na causa.
- Embargos de divergência improvidos”[2].
***
“PROCESSUAL CIVIL - AÇÃO RESCISÓRIA - PRAZO DECADENCIAL - ART. 495 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL - TERMO A QUO - TRÂNSITO EM JULGADO DA DECISÃO PROFERIDA SOBRE O ÚLTIMO RECURSO INTERPOSTO, AINDA QUE DISCUTA APENAS A TEMPESTIVIDADE DE RECURSO - PRECEDENTES - EMBARGOS REJEITADOS.
I - Já decidiu esta Colenda Corte Superior que a sentença é una, indivisível e só transita em julgado como um todo após decorrido in albis o prazo para a interposição do último recurso cabível, sendo vedada a propositura de ação rescisória de capítulo do decisum que não foi objeto do recurso. Impossível, portanto, conceber-se a existência de uma ação em curso e, ao mesmo tempo, várias ações rescisória no seu bojo, não se admitindo ações rescisórias em julgados no mesmo processo.
II - Sendo assim, na hipótese do processo seguir, mesmo que a matéria a ser apreciada pelas instâncias superiores refira-se tão somente à intempestividade do apelo - existindo controvérsia acerca deste requisito de admissibilidade, não há que se falar no trânsito em julgado da sentença rescindenda até que o último órgão jurisdicional se manifeste sobre o derradeiro recurso. Precedentes.
III - No caso específico dos autos, a questão sobre a tempestividade dos embargos de declaração opostos contra sentença que julgou procedente o pedido do autor refere-se à alteração do serviço de intimação dos atos judiciais, que antes era feita pelo correio para o advogado residente em outra capital, e que posteriormente passou a ser por meio de publicação de edital.
IV - Prevalecendo o raciocínio constante nos julgados divergentes, tornar-se-ia necessária a propositura de ação rescisória antes da conclusão derradeira sobre o feito, mesmo que a matéria pendente se refira à discussão processual superveniente.
V - Desconsiderar a interposição de recurso intempestivo para fins de contagem do prazo decadencial para a propositura de ação rescisória seria descartar, por completo, a hipótese de reforma do julgado que declarou a intempestividade pelas instâncias superiores, negando-se a existência de dúvida com relação à admissibilidade do recurso.
VI - Embargos de divergência rejeitados”[3].
Esclareça-se, entretanto, que tais precedentes adotam o trânsito em julgado material uno tão-somente para fins de contagem do prazo decadencial de dois anos para o ajuizamento de ação rescisória, tendo por objetivo evitar tumultos processuais.
Este entendimento parece ser reforçado pelo art. 509 do Código de Processo Civil[4], segundo o qual o recurso interposto por um litisconsorte aproveita a todos, salvo se os seus interesses foram distintos ou opostos, ao contrário da regra geral, em que o recurso aproveita tão somente ao próprio recorrente.
A regra geral está na personalidade do recurso, sendo excepcional a comunhão de interesses.
Em se tratando de relações jurídicas incindíveis que dão azo à unitariedade do litisconsórcio, não se concebe que os co-litigantes estejam no processo em defesa de interesses distintos e, muito menos, opostos. Sem que a relação controvertida seja uma só, incindível, vindo os litigantes ao processo na defesa de um só interesse de que todos são co-titulares, não se teria o litisconsórcio unitário.
Ao comentar o artigo 509 do Código de Processo Civil, o processualista José Carlos Barbosa Moreira ensina que:
"... a interposição tempestiva de recurso (independente ou adesivo), por qualquer dos litisconsortes unitários, é eficaz para todos os outros, inclusive para aqueles que tenham desistido de recurso interposto, ou em relação aos quais haja ocorrido fato ordinariamente idôneo a tornar-lhes inadmissível a impugnação (escoamento inaproveitado do prazo recursal, renúncia ao direito de recorrer, aquiescência à decisão).
(...)
A extensão subjetiva da eficácia abrange todos os efeitos que a lei atribua ao recurso interposto. Para a totalidade dos co-litigantes não apenas se obsta ao trânsito em julgado da decisão, mas também se devolve ao órgão ad quem o conhecimento da matéria litigiosa, nos lindes da impugnação oferecida; e ainda, quando suspensivo o recurso, permanece ineficaz (e portanto inexeqüível) si et in quantum, a decisão. Será provisória a execução acaso instaurada contra qualquer deles na pendência de recurso sem efeito suspensivo.
Devem considerar-se todos os litisconsortes como partes no procedimento recursal, inclusive os que porventura hajam aquiescido à decisão ou renunciado ao recurso; mas os que não recorreram, se repelido o recurso, não responderão pela parcela da condenação em custas e honorários relativa ao procedimento recursal.
GUILHERME CEZAROTI é mestre em Direito Tributário pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo e advogado do escritório Campos Mello Advogados em Cooperação com DLA Piper, com sedes no Rio de Janeiro e São Paulo.

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